E quando ele quer se confessar, aonde vai?
E quando se arrepende como faz?
Quando sente medo a quem recorre?
Em que altar em que terreiro seu santo dorme?
Vive triste desde que perdeu a fé
Às vezes ensaia uma oração,
um pai-nosso que estais no céu
e já nem se lembra do final.
Anda velho de si mesmo,
cansado do que não há
vazio do que não vê.
E quando quer ficar sozinho?
quando quer dormir,
ficar quietinho...
Ou quando quer brincar,
dançar, beber, beijar, ser feliz?
Tem pensado em ser ateu
Em virar monge,
plebeu
ou mudar-se pra uma aldeia
bem no meio da História
- nem passado nem presente -
só o poente haverá. Eternamente poente
o sol
o homem
e o céu.
E quando ele estiver velho e já perto de morrer,
quem vai lhe consolar as últimas dores?
Quem vai lhe convencer a morrer em paz
prometendo-lhe que existe vida depois da eternidade?
Se ele é Deus, o que será dele quando precisar pedir perdão?
O que será dele quando morrer sem extrema unção?
O que será dele, morto, ali, sozinho, nu e sem caixão?
E a quem ele vai rezar na sua última hora, a quem vai clamar por compaixão, se Deus é ele?
Se não há outro senão ele?
Se não há nada dentro dele - só o vazio - e fora dele -
só o vazio. O vazio de pessoas vazias - o que será dele?
Quem o salvará de sua própria vida? De sua morte quem o salvará?
Ah, morreu! Dirão.
Coitado, era tão bom! Dirão
Tão generoso, tão amoroso!
Era tanto tanto e só lhe faltou uma coisa ser:
ser humano.
Por isso é que somos todos assim - feitos à sua imagem e semelhança
somos todos assim - todos faltando uma coisa - faltando ser humano.
Ah, morreu, coitado, era tão bom este homem!
Dirão.
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