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Mostrando postagens de 2012

Meu primeiro poema

DESEJO E POESIA

Tantos desejos na hora do desejo antes do sopro. Tantos desejos Um só desejo. Poesia. Tudo que eu desejo é poesia. Quero poesia em tudo o que desejo Em cada gesto, em cada olhar, em cada riso, em cada beijo... Poesia no abraço do amigo, no choro da criança, no conselho, na história do avô na canção de ninar... Poesia na praia antes do mar nascer e depois de mar adormecer Poesia no quadro ainda branco na tela por se pintar e na mão do pintor a navegar Poesia nas velas, no leme, no porto no peito do homem que vem de veleiro e flutua no vento e dorme nas ondas mergulha em meu corpo me invade e me cobre e me morde e me come e me afoga no fogo da carne do seu poema quando me arranca de mim com os pelos do peito nas costas do meu continente doidas a ensaboar É esta poesia que desejo na hora dos desejos de antes de o sopro eu soprar e a vela e o veleiro e seus olhos queimar.

O olhar de um velho

Quando o olhar de um velho parece perdido - mais perdido está quem nele nada lê – O olhar fixo no vazio, Parado. Assim. Sem mirar. Não. Não tem nada de perdido – Só não é no agora que ele se vê O olhar perdido é só o espanto do jovem Olhando o velho a se olhar quando a inda jovem O olhar perdido do velho É o mesmo olhar do jovem na escada Que esbarra – descuidado - no ombro do velho O mesmo velho que, devagar, a passos lentos, Traz – por cuidado - os olhos presos nos degraus E agora, do alto dos seus tantos degraus – O velho pode, enfim, olhar pra baixo E desgrudar-se... E perder-se em seu olhar Olhando o jovem apressado e triste Na escada de sua vida pulando degraus Sem nem sequer imaginar – meu deus! A enorme falta que lhe farão – um dia – Esses mesmos degraus Que seus olhos, agora, desavisados, Teimam, cegos, em amputar.

TUA

Ah, essa tua carne morena coberta de pelos! Essas m ãos grandes que conhecem meus esconderijos mais escondidos ! É a tua mão que me devora antecipada quando me afaga os cabelos da nuca (tu não esqueces de me levantar os cabelos e de encostar teu corpo todo no meu, só para que eu sinta quem é que me guia enquanto eu perco a direção) e é tu que me deixas louca quando me morde o canto da boca. Depois me tatuas a pele com a barba desenhando em minhas costas - com a dor lenta que todo prazer sempre tem - estradas de se perder pra sempre (as mesmas onde perco a direção). Eu só preciso sentir teu corpo agora - dá-me teu corpo - põe teu corpo em mim, em minhas mãos tão menores que as tuas - põe teu corpo em minha boca, põe! Quero teu corpo agora. Todo ele atracando em meu cais e me afogando enquanto pesa sobre mim! Enquanto me doma e me incendeia e me põe em erupção quando me tem assim - inteira - tua - só para o teu prazer, só para te satisfazer, tua cativa - perdid

SEMENTES

ANTIGAS FOTOS

Rever antigas fotos na esperança de - com elas - reviver antigas alegrias é tão em vão quanto o debater desesperado de quem afoga e adivinha no afogamento a própria morte.  O tempo é impiedoso com a vida e vai nos matando aos poucos desde o dia em que nascemos - assim - desavisadamente.

A MELODIA DOS PLANETAS

- E o que seria do mundo sem música? - O mundo não existiria. Ele próprio gira na mais exata melodia, com acordes tão perfeitos que nunca desafinam. Se desafinassem as notas dos planetas, eles seriam carrinhos de tromba-tromba e não planetas. E o universo um grande parque de diversões sem ninguém a control ar .  Sem música? Não... Não há o sem música, simplesmente não há.

LETRINHAS

Vontade linda de ser criança outra vez - só para aprender de cada letrinha o gosto, o cheiro e a cor tudo de novo! Aprender é que é ser feliz e tem gente grande que ainda não aprendeu nem isso.

NOSSA CONVERSA

- Nem terminamos a conversa de ontem!  - Espero que nossa conversa nunca termine. Que sempre haja uma reticência entre nós. Que se for para ficarmos em silêncio, que seja no máximo por um ponto e vírgula - nunca por um ponto final. Quero sempre um etc para que tenhamos motivos (novos ou velhos) para uma próxima conversa ou simplesmente para continuarmos de onde paramos a de ontem.

IRMÃO DE ALMA

Irmão de alma – de todas as vidas que juntos vivemos - Esteja comigo agora , mais que nunca, Pois nada me assusta mais que a Felicidade: Esta mistura de todas as sensações Que há para se sentir E que nem palavras Inventadas ainda há Para se descrever Para se dizer Mas como sentir o que não se pode dizer? É o incompreensível tomando posse de mim , o irracional t apando meus olhos e me fazendo ver, enfim, c oisas que meus olhos - abertos - me impediram a vida toda de ver. Felicidade nada tem a ver com olhos abertos: É d e olhos bem cerrados que somos mais felizes, irmão de alma.

INSPIRAÇÃO

Agora é assim - Inspirei, vem poesia!  E cada fôlego - um poemão!  Eu q uero mais é sê Foiz do Iguaçu  c ruzando com Niágara . C ansei de ser qua r qu é quedinha d'água -  vem ni mim inspiraçã o! A dispois nóis vê si é bã o!

PREVISÃO DO TEMPO

Previsão do tempo para hoje: Tempo de encher meu coração - encher meu coração de mim. Meu coração andou vazio de mim por tempo demais - andei enchendo meu coração de outros e aí nunca houve espaço para mim - ou, quando houve, foi sempre um espaço tão pequeno que lá estava eu - apertadinho ali no canto escuro - apertadinho e esquecido - ora era o menino assustado, ora a menina de tranças arrancadas. Agora é tempo de encher meu coração de mim. Quero inundar-me de mim. Inundar-me tanto de mim até vazar. Encher, então, meu pulmão, meu rim, meu ser todo. Quero ser inteiro um mar... um oceano ... todo feito assim - todo feito só de mim.

ACORDA

Sinto que a corda me foi jogada e que vou começar a escalada para sair do poço. Aliás, já nem há o poço. Só há a saída a ser subida e a vida inteira lá fora a ser doidamente saboreada por mim (mordida a mordida, pedaço a pedaço) . D e lamber os beiços - de dar água na boca - de senti-la na língua toda, de engoli-la devagar e digeri-la com o corpo todo. Um sistema digestivo só é pouco demais pra toda a vida que eu quero e tenho pra comer. A corda não me tira só do poço. Ela me põe na órbita da Lua e de lá me lança para a estrela mais distante. Sei lá se de lá algum dia eu retorno. Sei lá.

AMIGO É SINGULAR

Sempre tive aversão a cobranças Sejam bancárias, telefônicas, imobiliárias... Sejam de "amigos". Não se cobram amizades, como não se cobram amores - ou se é amigo ou não se é - aliás, esta é a e ssência, a própria alma da amizade. Existe sempre aquele amigo de quem eu passo meses sem ouvir a voz e aí, de repente, eu o encontro e parece que nos falamos há um minuto. Trocamos um abraço que não é só de corpo, é de alma - trocamos um olhar - que fala mais que todas as palavras e que todo o silêncio do tempo do silêncio. E não há cobrança alguma. Há uma cumplicidade - um sabe que o silêncio do outro não foi falta de amor, foi excesso de vida a viver, de luta a lutar e de dias curtos demais com tanto a se vencer. Mas há amigos que são bons com palavras e nos fazem bem quando falam - mas é só isso. São amigos que no silêncio se calam de verdade. Amigos que depois da distância, na hora do encontro, viram hiato e não ditongo. Palavras são como embrulhos de presentes - podem ser l

TRIGONOMETRIA

Nunca pensei que um dia acharia trigonometria, báskara, pitágoras e logaritmo mais simples que viver...   Nem podia imaginar que as combinações químicas da dona Cleide podiam ser tão simples se comparadas a entender o que se passa em minha mente em um simples segundo de pensamento. Também não imaginei que as datas das guerras todas e os nomes dos generais que as ganharam e as perderam pudessem ser tão mais fáceis de entender do que o que sinto aqui sozinho comigo mesmo agora, por exemplo. Isso para não falar da descomplicação absurda da Geografia, Biologia, Filosofia, Sociologia, Arte, Inglês - diante da mais aparentemente simples das questões de qualquer prova: Quem sou eu? Pior é pensar nas análises de todas as orações subordinadas subjetivas, adverbiais e adjetivas da Dona Gildete, da dona Rita e do Marcos juntas, que não chegam nem perto das complicações de uma simples sessão de terapia comigo mesmo em frente ao espelho que não vejo todo dia quando acordo, mas sei que es

O CAMALEOA

O camaleoa ao tocar-me a pele disfarçou-se de mim e desde então - sou ela a fingir-se de mim. Costuro flores com a linha do horizonte e delas faço cortinas imensas pra cobrir incertezas O camaleoa muda de cor quando quer e vira outra mulher muda de cabelo e de gestos de olhares e de pele Não é só a maquiagem ao redor dos olhos é seu próprio olhar que muda o tempo todo. Inundo abismos com gotas de suor de tanto destruir pontes e escondo atrás dos montes os restos de antigos segredos revelados E a camaleoa sou eu mesma Que vivo me disfarçando de mulher Que ando vagando dentro do labirinto que  veio morar dentro de mim quando nasci -  Não quando nasci - quando me nasceram a mim - Nascemos quando aprisionam nossa camaleoa a um nome e a um sexo e a um corpo e a um jeito de cruzar as pernas e de dizer bom dia e de olhar o homem de peito peludo que atravessa - suado - ao meio-dia, sem camisa,  o portão da minha casa e entra na minha sala

POR UM INSTANTE SEM PENSAR

Alguém, por favor, cale o meu pensamento Alguém, por favor, esfaqueie-o ou o sequestre E o leve para uma fogueira Na velha inquisição espanhola ou em Salém E o abandone lá – queimando eternamente Alguém, por favor, amarre braços e pernas Do meu pensamento – que ele não ande Não gesticule ... Alguém lhe arranque a boca miserável Que ele não se alimente das minhas dúvidas, meus medos Que ele morra seco – anorexia, inanição Alguém, enfim, fure os olhos e ouvidos do meu pensamento Se ele nada vir e nada ouvir não terá nada em que pensar E eu, finalmente, saberei o que é ser liberto - alforriado Livre de pensar em tudo que meu pensamento pensa Sem minha permissão No estupro de invadir-me o tempo todo De estripar-me o tempo todo Sem nunca me dar a chance A misericordiosa chance do silêncio Talvez – na morte – e só na morte Na minha ou na de meu pensamento Haja, enfim, o não-pensamento O vazio, a paz, a não-linguagem O não-eu que há tanto