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MINHA FÊMEA







E agora você me vem falar de abismos
como se eu não os carregasse comigo...

E agora você me mostra jornais,
me interroga falácias
e me carrega no bolso por onde foge

Não. 
Não quero seu semblante 
ferro de passar mentiras
nem quero a sua pausa
bala sem nenhum gatilho

Valha-me deus -
de pernas cruzadas 
no fim do corredor -
com selo e carimbo nas mãos
Valha-me a pele da lontra
que a mulher feia
exibe no ombro
pra menos feia parecer...

E nas vitrines tantas vozes sem cara
corpos nus embaixo de vestes cruas
e tudo isso e nada 
e cada coisa é um mundo inteiro

Não. 
Não me venha falar de lìnguas
à míngua de beijos,
sem verso
sem calo...
de nada valem as pernas cruzadas
a pele da lontra
e a ponte no abismo
se o que fica depois do gozo
é seu gosto na minha carne
- convulsa carne
dos meus seios tão nus -
feito a fome dos canibais
feito o medo
do estuprador

meu sexo inteiro te quer engolir agora:
linha tênue do seu ser poente
minha fêmea no seu cio ardente...









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MORMAÇO

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A VOZ

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A DOCE VINGANÇA DO ANJO CONTRA O TEMPO

(a Gabriel Garcia Marques) Muito tenho me inimizado com o tempo nos últimos tempos Muito tenho lhe lastimado as horas que me rouba Muito lhe amaldiçoo toda noite pela noite que se esvai de mim  Que cai pelo vão dos meus dedos vãos que de nada servem pois não podem segurar as areias do tempo na velha ampulheta do tempo escorada pra sempre na muralha das esperanças idas perdidas na ilha dos anteontens... Mas eis-me aqui, agora, diante de ti que não te lembras nem mesmo de ti teus cem anos de solidão tuas putas tristes teu cólera e todo o amor vivido em seu tempo E agora que tua memória vive em outro tempo? E agora, Gabriel, sem tua memória, em que tu pensas? E agora, como posso ler-te agora? Oh, como te invejo hoje mais que nunca! Como invejo o livre de tuas horas livres o sem-tempo de teu sem tempo teu presente sem nenhum passado teu passado sem nenhum futuro e teu futuro sem nenhuma pressa Ah, o esquecimento! Quão doce