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NA CASA DE AREIA


E de repente – sim - assim bem de repente – as expectativas – as perspectivas que alguém um dia desenhei pra mim – desvanecem qual areia na casa de areia engolida pela duna. Minha casa de areia cheia de móveis velhos – imóveis. Em cada móvel, guardei um sonho e quando a areia tudo cobriu de areia, não deu tempo de nenhum sonho salvar.

Agora estou aqui – olhando a casa – o lugar da casa – onde um dia alguém plantei uma casa – comida por areia – estou aqui e a casa não está mais – nem ela nem seus móveis com meus sonhos dentro. Eram sonhos – dirão – e o que são sonhos senão sobrados vazios na tempestade de areia? A verdade é que embaixo da duna, sob o peso da areia – os sonhos estão lá – nos móveis ainda mais imóveis agora – meus sonhos me esperam velhos de mim e velhos de si.

Estamos assim, agora, meus sonhos e eu – esperando... esperando. Passo dias e dias a esperar. Às vezes vou até a janela que alguém inventei pra mim e olho a rua – imagino uma rua e dou a ela um nome, depois esqueço, apago a rua, cerro a janela e volto pra cama – a cama que alguém arrumei pra mim.

Ninguém nunca me ensinei a viver sem esperar algo da vida. A viver sem pendurar castelos nos varais das varandas em noites de lua. Nunca aprendi a viver um dia de cada vez e agora que só me restam os dias – um atrás do outro antes do outro ... o que fazer com a areia que escorre dos meus dedos há tantos anos? O que fazer da areia que trago comigo lá da casa antiga – soterrada, engolida, junto com meus sonhos, junto comigo... o que fazer? O que fazer comigo?

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